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FRUTOS CORROMPIDOS

Não obstante o Brasil se orgulhe de seu gigantesco rebanho cristão, a Nação ainda não exibe as marcas do evangelho. Não há evidências de conversão de caráter, capaz de mudar o curso de um país gerado sob o flagelo da corrupção, do lucro desleal, da extorsão e da miséria de seu povo. A perpétua queda de ministros apodrecidos é apenas amostragem de uma safra que não se restringe à política. Frutos temporãos corrompidos eis por toda parte, inclusive dentro dos muros caiados de algumas instituições religiosas.
Uma nação convertida aos valores do evangelho é uma nação moralmente sadia. Rege-se pela honestidade, pelo compromisso com a palavra lançada. Equidade. Altruísmo. Integridade. Se quiserem dar outra roupagem, chamem isso de probidade administrativa, eficiência, prestação de contas, justiça, responsabilidade fiscal, interesse público. Isso tudo tem cheiro de evangelho, aroma de pureza que contrasta com o mau odor que assopra de muitas instituições federais, estaduais e municipais.
Curiosamente, quase todo político brasileiro se declara cristão. Ministros, governadores, prefeitos e outros do baixo escalão na quadrilha do crime de colarinho branco são frequentadores assíduos de igrejas. Papa-hóstias. Murmuradores de cânticos sacros. Réus do corpo e do sangue de Cristo durante cultos evangélicos, onde costumam posar com auréola de iluminados. Tem ouvidos, mas não ouvem as pregações. Olhos, mas não veem as necessidades do próximo. São miserês do ofertório, lançando na salva algumas moedas perdidas, tiradas do bolso-sem-fundo da corrupção.
Por seu turno, enquanto ministros-judas-iscariotes se revezam na guarda do dinheiro público, o Censo informa que a Nação está sendo convertida ao evangelho. Católicos permanecem a grande maioria. Evangélicos crescem sem parar. A cada dia, uma nova igreja. E eu me pergunto: cadê as marcas do evangelho nesta nação? Que tipo de fé é essa, onde políticos, cristãos confessos, roubam descaradamente o País? Onde nem mesmo alguns saído do clero têm revelado sinais de conversão pessoal, mas têm sido venais, envolvendo-se em escândalos financeiros, corrompendo-se com seus pares de igual para igual.
Na verdade, de conversão ao evangelho temos ainda muito pouco. A maior prova disso é o tipo de pregação em voga no país. Hoje, alguns líderes religiosos são de causar inveja a velhos políticos corruptos. Em poucos anos, alguns pastores do Brasil saíram de uma vida de assalariado para a elite econômico-financeira da Nação. Como conseguiram isso? Trabalhando pelo evangelho, à semelhança de Paulo, Pedro e João? Não: corrompendo pessoas em nome de Deus. Arrancando do bolso do povo tudo quanto o malsinado político deixou incólume. Malditos homens! Mercenários da Palavra e da consciência alheia. Para essas almas, o fogo do Inferno arderá sete vezes mais. Os maus políticos terão melhor tratamento no Dia do Juízo.
É incrível como a religião cristã é tentada a formar império e obter privilégios. Semana passada, jovens clamaram na Praça de São Pedro contra a isenção tributária do Vaticano. Por aqui, nem isso. Vivemos um pacto de mediocridade cristã. Clérigos fingem que vivem o evangelho e o povo igualmente finge que se converteu à fé. Porém, sinais de todos os lados não apontam isso. Nem quando ministros apostam quem rouba mais em seu turno, nem quando alguns evangélicos entram na política. A estrutura social brasileira continua apodrecida.
No máximo, este é um país religioso. Do poder regenerador do evangelho, há raríssimas evidências.
Rui Raiol é escritor (www.ruiraiol.com.br)